sexta-feira, abril 21, 2006

Soneto para Fernanda

Pequena pérola de luz
num cofre de conchinhas,
guardado no mar
que guardas na alma.

Alegre lágrima perdida
a rolar pelo sorriso solto,
naufraga dos teus olhos
castanhos da côr da terra.

Mil olhares para o céu,
mil passos na margem,
das páginas que escreves.

Promessa de flor humana,
agarrada a ti como as margaridas
que trazes a beijar-te o cabelo.

quarta-feira, abril 12, 2006

Às vezes...

Às vezes...

Às vezes penso que só existes na ponta dos meus dedos, quando desenho o teu corpo por cima da roupa com que o tapas, que só existes naquele espaço que escavaste para ti no meu ombro esquerdo, aquele espaço onde os teus sonhos nascem e terminam.

Às vezes bebo a minha força dos teus lábios, como se tudo aquilo que preciso para viver nascesse na tua voz cantada em notas roubadas, como se os teus lábios finos fossem os pilares que sustêm o meu mundo, o meu firmamento, tudo o que conheço.

Às vezes acordo nos teus braços e tenho medo de me mexer, medo até de respirar, medo que um só sopro afaste a névoa de calor e chuva que o teu corpo encostado ao meu provoca nos meus olhos, que aquele peso subtil do teu corpo no meu desapareça.

Às vezes, fico acordado a ver o sol nascer pela janela do teu quarto e encher os teus caracóis de dourado, banhar os teus ombros nus de mel luminoso, enquanto te olho adormecida e espero que acordes com os olhos cheios da luz matinal.

Às vezes tento desenhar palavras em páginas amarrotadas, juntar em quadros escritos os pedaços mal cortados deste mundo que construí para ti, que construí na esperança de um dia ser só nosso, só meu e teu.

Às vezes, até acho que consigo viver sem ti, respirar sem ti, voltar a olhar o céu como o olhava antes de teres dado novo nome às estrelas, acordar como acordava quando estava só, fazer o pequeno-almoço só para mim, viver só para o meu corpo.

Às vezes...

terça-feira, abril 11, 2006

volto amanhã

os meus pensamentos voam soltos

como dragões na névoa irreal do quarto

fazem uma escadaria para onde a lua brilha

e os teus olhos nunca choram

nem mesmo quando eu os faço chorar

faço festas nas ondas douradas do teu cabelo

enquanto espero que acordes para me despedir

não chores mais meu amor eu volto amanhã

para onde os teus lábios me tentam agarrar

agora não me abraçes amor senão não consigo voar

terça-feira, abril 04, 2006

Estátua de Sal

Debaixo desta torrente de líquido quente que me escorre pelo cabelo para a cara, para as costas, para o resto do corpo, tento apagar o cheiro de ti, substituir o calor de ti pelo calor da água que o chuveiro vomita violentamente.
Viro a cara para cima, talvez olhando este mar fervente consiga apagar os teus olhos dos meus, mesmo assim, talvez mesmo com eles fechados, te consiga apagar, a água entra-me morna pelos lábios, recorda-me a tua língua, também a água dança na minha boca...
Entras neste mundo de vapor como uma avalanche morena, o teu cabelo apanhado no topo da cabeça, pareces uma medusa pronta a consumir o mundo, a transformá-lo em pedra, a mim transformas-me numa estátua de sal, sal que se tenta desfazer debaixo desta cascata antes que me desfaças tu com os teus lábios.
Agarras-me pelas costas, as formas do teu corpo frio coladas a mim como uma sereia a uma rocha fria da praia, cruzas as mãos no meu peito e cantas baixinho, encostas a cara ao meu coração, ouves o que sinto através das minhas costas, escondida da água e do mundo pelos meus ombros, a canção que me teces pergunta-me se há espaço para ti.
Meu amor, para mim não existem espaços sem ti.