Enquanto escrevo este texto, está
um melro a tentar segurar-se no cabo eléctrico que atravessa a rua. Não está
fácil para o melro… o facto de não ter predadores naturais nas ilhas (salvo, é
claro, um ou outro jovem meliante com uma pressão de ar), tornou-o gordo e
pachorrento, arrogantemente seguro de si. Se o melro tivesse na sua posse os
meios da auto-estrada informativa, tal e qual como todos nós, receberia os
avisos da Protecção Civil na sua página de Facebook, ou Twitava aos outros melros (piada obscura de
professor de língua inglesa… inserir sorrisos amarelos). Mas o nosso melro é
jovem, vive no presente, e quer apenas saber onde e o que comer, andar
pendurado com os outros melros, ...ui, piar às melras…e por aí adiante.
Nada, na sua estreiteza de
pensamento e de visão do mundo, o teria preparado para o que se aproximava.
Talvez… talvez dentro de si, um
instinto animal o tivesse avisado, como um calafrio ou um nó no estômago, mas
encolheu as suas asas, era verão, estava a engordar e a comer bem, e lá vêm as
melras a passar… e qual instinto de aviso qual quê.
Agora segura-se com garras e bico ao cabo. As
suas pequenas são asas incapazes de aguentar a sua pança e de se levantar voo
no vendaval. Nunca foi religioso mas agora promete cumprir promessas e toda
essa litania (Tenho dúvidas sobre isso, mas nunca falei directamente com ele,
portanto não o posso afirmar).
E lá está o nosso amigo melro, a
segurar-se…e a segurar-se… precariamente, tal como nós, os portugueses, à
espera de resistir a este vendaval que não esperávamos, mas que na verdade,
sabíamos muito bem que aí vinha.