segunda-feira, janeiro 30, 2006

Se tu não tivesses olhado para mim

Hoje, enquanto a neve caía, pensei para mim que este era um momento único, daqueles momentos que ficam gravados na memória como momentos de felicidade pura, e que sobrevivem mesmo quando os pormenores se esbatem, mesmo quando apenas a recordação vaga como vapor permanece, e a noção do que se passou vagueia pelos recantos da nossa mente, para ser encontrada apenas quando sorrir é necessário.
E no meio da minha alegria, pensei em ti.
Mas não te preocupes, disfarcei bem, ninguém percebeu, ninguém viu o fantasma de ti passar pelos meus olhos, pela minha boca, beijar-me os pensamentos.
Já mais tarde, sentado a secar ao calor, os meus pensamentos perderam no fogo, o seu calor a fazê-los voar, a fazê-los viajar para onde eu não quero que eles vão, para os teus braços, para o teu calor.
Oxalá estivesses aqui, este dia podiamos tê-lo partilhado, como duas crianças que partilham uma concha do mar, sem dúvidas nem condições, apenas o momento, apenas a alegria.
Uma voz do fogo sussurrou-me então levemente, mais valia nem te ter conhecido.
Essa pequena chama instalou-se em mim, ardeu um pouco e morreu.
Morreu porque eu sei que, se tu não tivesses olhado para mim, tantas vezes com amor, e outras tantas, tantas vezes com lágrimas a taparem a luz dos teus olhos, eu não saberia.
Se tu não tivesses olhado para mim, naquela primeira manhã da nossa vida, eu não saberia abraçar, segurar um coração com um abraço terno e seguro, nem saberia pular para o infinito, sem corda. sem rede, sem medo, só amor e esperança. Não saberia o real valor da fé, aquela fé inabalável que vem depois de acordar nos teus braços.
Se não tivesses olhado para mim, e eu para ti, um banal cruzar de olhos para todos os outros, num café estupidamente cheio, será que eu seria eu?
Provavelmente.
Mas se não tivesses olhado para mim, naquela manhã quase tarde em que acordámos nos braços um do outro, eu não saberia amar, amar realmente, aquele amor sem condições, sem dúvida, sem esperança de salvação.
Aquele amor que sabemos existir sem precisar de palavras para o dizer, ou sequer pensar.
E é assim que me vou deitar, cheio de certezas e saudades, mas mais de dor que tudo mais, porque não vou acordar mais embalado no teu olhar, por mais que neve lá fora.

7 comentários:

Sophia disse...

Oh como compreendo este poema, de mágoas, saudade e amor e coração partido. Tu sabes a minha história, portanto... Está divino!!! E... fala de neve!!! Este vou aconselhar no meu blog! Lamento, mas vou. Já há muito que tinha vontade de o fazer. Desta é de vez!

Tamia disse...

Este é daqueles que nos vamos lembrar muitas vezes, por causa do dia único que tivemos, em que caiu um nevão na nossa linda cidade!

Anónimo disse...

Gostei muito do teu texto Vi.
Um beijo

E.R.

Anónimo disse...

Muito bonito!
Então você gosta do silêncio do amor, não é?
É esse o silêncio que eu procuro, onde as palavras não são necessárias, apenas um olhar, um gesto e tudo se entende. Palavras muitas vezes são erros. Erros que eu queria evitar, mas não consigo.
E quando esse silêncio entre os amantes se vai, quando acaba e você continua com o amor em ti, tu começas a ouvir tudo, a ouvir tudo que não ouvia antes, você sente que o tempo passa, porque o silêncio entre os dois não existe mais para que criem seu próprio tempo.
Bom, fico contente que conheça sobre Sylvia Plath...A pouco tempo conheci um pouco mais de sua vida e obra e muito apreciei.
Um abraço,
Fernanda

A. disse...

Lindo... Simplesmente lindo! =)
E isto chega porque mais uma vez fiquei sem palavras...
Bjs***

ananda disse...

Está lindo (como sempre)! Beijinho!
p.s. - já te adicionei ao msn. Espero encontrar-te em breve! ;)

Heavenlight disse...

É assim. Por mais que nos faça sentir depois vazios, o amor que experimentámos deixa-nos sempre algo, dá-nos sempre alguma coisa de positivo, ajuda-nos sempre a crescer.
Este texto está muito bem escrito, e lindo, como já é habitual em ti!