Só tu sabes o que enfrentas.
Acordas ao meu lado nos dias bons e adormecemos nos braços um do outro nos dias maus.
Mas eu sei o peso que carregas.
Só a mim a tua força não espanta.
Fazia vento nessa tarde, trazias o cabelo preso, e mas algumas madeixas soltas cortavam-te o rosto, como barras de uma prisão para os teus olhos.
Viste logo na minha cara o parecida que estavas com ela.
Soltaste os cabelos e olhaste-me nos olhos como que dizendo, eu sou eu, não sou ela.
Percebi.
Sentaste-te do outro lado da mesa, falando a todos com aquela voz de menina que sabes que me irrita, provavelmente ainda magoada por eu te ter achado parecida.
A conversa continuou por algumas horas até que, sem que ninguém se apercebesse, ou talvez tivessem percebido muito bem mas não quisessem mostrar, me mandas-te o olhar.
Já me enviaram esse olhar vezes suficientes para o reconhecer imediatamente.
O olhar "temos de falar".
Pedi logo uma bebida forte num copo grande, sem gelo, ajuda-me a pensar enquanto bebo, e a primeira coisa que pensei foi que asneira teria eu feito.
Às vezes sou mesmo cego.
O tempo passou e fomos ficando.
Era aquela hora, mesmo antes de jantar, em que os cafés ficam vazios e até os empregados desaparecem. Já estavamos sozinhos, mudos, a olhar o cinzeiro à cinco minutos e matei o resto da bebida de uma vez, para afogar o silêncio.
Disse logo, Então?
Hesitaste, talvez a pensar se o plano resultaria agora que o tinhas de pôr em prática. Mas tu és forte, e avançaste.
Eu não sou ela.
Eu sei, nunca disse que eras, e...
Cala-te.
A minha cara endureceu logo, sempre odiei que me mandassem calar, mas vi que tinhas ficado um pouco arrependida e resolvi poupar-te um pouco e soltar um meio sorriso.
Ainda pensas nela?
Sempre.
Baixaste os olhos, como se te pesasse cada palavra.
Ainda a amas?
Sim, respondi eu, depois de dois meses a dizer a mim próprio que não.
E nós?
Nós o quê?
Como ficamos?
Como quiseres.
O vento tinha parado, e as ruas estavam vazias, pairávamos entre o dia e a noite, naquele espaço de tempo em que a luz parece ser azulada. O silêncio entre nós era como se fosse uma almofada que crescia a cada segundo. Eu tinha feito o que devia. Tinha sido um idiota, facilitado tudo. A decisão era tua, ias decidir bem, ias mandar-me passear. Mínimo de sofrimento a longo prazo para os dois. A decisão correcta.
Eu quero.
A tua voz saiu devagar, cada sílaba uma certeza, uma pedra, uma torre, uma montanha.
Ouviste?
Ouviste?
Mas eu não ouvia, só via a tua mão pequena brincando com a chávena do café. Agarrei-a devagarinho, estava gelada e ficava mesmo pequena na minha, olhei-te e nada disse.
Vamos para casa?
A tua voz saiu meio rouca, como se no último momento hesitasses, talvez tivesses percebido mal, talvez eu estivesse a dizer adeus, a mandar-te embora.
Vamos.
A minha resposta ficou a pairar no ar como uma pena, como se o seu verdadeiro significado não fosse real, como se se tivesse perdido no momento. Levantámo-nos, a tua cara estava séria, como se a resposta não fosse o que estavas à espera, como se não soubesses o que fazer agora.
Só a meio caminho de casa me deste a mão, e nessa noite fui dormir em minha casa. Estava bem claro, tu não eras ela, mas também não eras a outra. Não vou mentir, sempre a vou amar. Ela fez parte de mim demasiado tempo para a apagar.
Sempre foste forte, lutas todos os dias por nós.
Quero que saibas...
Não...
Preciso que saibas que todas as noites quando me deito, e todas as manhãs quando acordo, o faço ao teu lado, que não estás em segundo lugar.
Podes posar esse peso que carregas.
Não quero acordar ao lado de mais ninguém.
Acordas ao meu lado nos dias bons e adormecemos nos braços um do outro nos dias maus.
Mas eu sei o peso que carregas.
Só a mim a tua força não espanta.
Fazia vento nessa tarde, trazias o cabelo preso, e mas algumas madeixas soltas cortavam-te o rosto, como barras de uma prisão para os teus olhos.
Viste logo na minha cara o parecida que estavas com ela.
Soltaste os cabelos e olhaste-me nos olhos como que dizendo, eu sou eu, não sou ela.
Percebi.
Sentaste-te do outro lado da mesa, falando a todos com aquela voz de menina que sabes que me irrita, provavelmente ainda magoada por eu te ter achado parecida.
A conversa continuou por algumas horas até que, sem que ninguém se apercebesse, ou talvez tivessem percebido muito bem mas não quisessem mostrar, me mandas-te o olhar.
Já me enviaram esse olhar vezes suficientes para o reconhecer imediatamente.
O olhar "temos de falar".
Pedi logo uma bebida forte num copo grande, sem gelo, ajuda-me a pensar enquanto bebo, e a primeira coisa que pensei foi que asneira teria eu feito.
Às vezes sou mesmo cego.
O tempo passou e fomos ficando.
Era aquela hora, mesmo antes de jantar, em que os cafés ficam vazios e até os empregados desaparecem. Já estavamos sozinhos, mudos, a olhar o cinzeiro à cinco minutos e matei o resto da bebida de uma vez, para afogar o silêncio.
Disse logo, Então?
Hesitaste, talvez a pensar se o plano resultaria agora que o tinhas de pôr em prática. Mas tu és forte, e avançaste.
Eu não sou ela.
Eu sei, nunca disse que eras, e...
Cala-te.
A minha cara endureceu logo, sempre odiei que me mandassem calar, mas vi que tinhas ficado um pouco arrependida e resolvi poupar-te um pouco e soltar um meio sorriso.
Ainda pensas nela?
Sempre.
Baixaste os olhos, como se te pesasse cada palavra.
Ainda a amas?
Sim, respondi eu, depois de dois meses a dizer a mim próprio que não.
E nós?
Nós o quê?
Como ficamos?
Como quiseres.
O vento tinha parado, e as ruas estavam vazias, pairávamos entre o dia e a noite, naquele espaço de tempo em que a luz parece ser azulada. O silêncio entre nós era como se fosse uma almofada que crescia a cada segundo. Eu tinha feito o que devia. Tinha sido um idiota, facilitado tudo. A decisão era tua, ias decidir bem, ias mandar-me passear. Mínimo de sofrimento a longo prazo para os dois. A decisão correcta.
Eu quero.
A tua voz saiu devagar, cada sílaba uma certeza, uma pedra, uma torre, uma montanha.
Ouviste?
Ouviste?
Mas eu não ouvia, só via a tua mão pequena brincando com a chávena do café. Agarrei-a devagarinho, estava gelada e ficava mesmo pequena na minha, olhei-te e nada disse.
Vamos para casa?
A tua voz saiu meio rouca, como se no último momento hesitasses, talvez tivesses percebido mal, talvez eu estivesse a dizer adeus, a mandar-te embora.
Vamos.
A minha resposta ficou a pairar no ar como uma pena, como se o seu verdadeiro significado não fosse real, como se se tivesse perdido no momento. Levantámo-nos, a tua cara estava séria, como se a resposta não fosse o que estavas à espera, como se não soubesses o que fazer agora.
Só a meio caminho de casa me deste a mão, e nessa noite fui dormir em minha casa. Estava bem claro, tu não eras ela, mas também não eras a outra. Não vou mentir, sempre a vou amar. Ela fez parte de mim demasiado tempo para a apagar.
Sempre foste forte, lutas todos os dias por nós.
Quero que saibas...
Não...
Preciso que saibas que todas as noites quando me deito, e todas as manhãs quando acordo, o faço ao teu lado, que não estás em segundo lugar.
Podes posar esse peso que carregas.
Não quero acordar ao lado de mais ninguém.
3 comentários:
Pois, está realmente nota 20, so lamento fazer-me recordar certas coisas menos felizes... Mas realmente fiquei muito surpreendida pela beleza do texto e por nunca ter lido nada assim da tua parte. Aconselho-te vivamente a fazeres o seguimento e escreveres um livro. Está lindíssimo!!! Parabéns!!! Nem sei mais que dizer... as palavras tornam-se escassas para me expressar.
Concordo com a Shootin': está nota 20, sobretudo porque está muito real.
Sabes? é muito difícil para qualquer pessoa ser parecida com a "OUTRA" ou o "OUTRO", e saber que amam a alguém que carrega no peito um outro amor. Sei-o porque eu já fui aquela que olhava para o homem ao lado de quem acordava todos os dias e pensava: ele sonhou com ela. Eu estarei sempre em segundo lugar. Fiz as mesmas perguntas que a personagem do teu texto, num outro café, num outro tempo. E obtive as mesmas respostas. Também já fui eu a dar essas respostas ao único homem que me amou intensa e verdadeiramente, e tinha toda a consciência de que o estava a magoar, pois já o sentira na pele.
Somos fortes para magoar, mas somos muito fracos ao fazê-lo. Somos ainda mais fortes ao enfrentar essa mágoa, mas enganamo-nos a nós próprios.
O teu texto fez-me sentir tudo isto. E tive mesmo que o escrever, embora saiba que este comentário está enorme. Tens o dom de, com a tua escrita, despertar memórias, sentimentos adormecidos, e esse dom é inato somente nos verdadeiros escritores - os que escrevem a partir do seu coração e da sua alma.
PARABÉNS!
O melhor ABOUT ME que já li!
Quem sou eu? Isso já o Hamlet se perguntava, e já na altura era uma pergunta idiota.
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